segunda-feira, 26 de setembro de 2011

    Hoje ao passar a roupa a ferro deixei vaguear o pensamento pelo passado. Recordei as noites de inverno passadas junto à lareira, lareira que se ia extinguindo até ficarem somente as cinzas quentes. Extinguia-se a lareira como se extinguia a vida dos que lá moravam. Uns partiam para não mais voltarem; eu parti para voltar algumas vezes e outros ficaram até a chama que lhes dera luz se extinguir de todo.
Hoje, passados tantos anos recordo com grande saudade as conversas que se passavam entre os membros da família. Contavam-se factos verdadeiros, histórias com pouca realidade e falava-se sobretudo em pessoas: era a minha tia Mariana, tia da mãe, que fazia uns bolos deliciosos cozidos sobre as lajes da lareira; era a tia Maria Inácia duma brandura sem limites, a ponto de quando os filhos não queriam despir uma roupa que lhes agradava, estragavam-na sem nunca chegarem a tirá-la.
   Também se falava muito nos avós. A minha avó materna era pouco preocupada com a casa. Algumas vezes abalou deixando os filhos entregues uns aos outros e ia visitar os irmãos montada na sua mulinha parda. No fim da visita vinha com a mula carregada pois os irmãos viviam com maior abundância. Enquanto ela ia e vinha, os filhos, com pouco que comer e sem nenhum dinheiro, pegavam num enorme cesto de verga e vá de apanhar medronhos (quando na época, claro está) e vender no alambique onde se fabricava a aguardente. Com o produto da venda compravam o café e o açucar com que se alimentavam acompanhado de bom pão. Lá o pão era bom, sempre foi!
Falava-se ao avô paterno que num desastre de carroça partiu uma perna e sem poder andar arrastava-se até ao campo de sementeira e sentado numa cadeira ia ajudando nas sachas.

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